Acho que podemos concordar no seguinte ponto: tomar um gelato vai muito além de uma deliciosa experiência culinária. Significa, também, preservar e nutrir interação, convívio, intercâmbio cultural e social, além de trazer alegria, conforto à alma e frescor ao paladar. Lembro-me vividamente de quando meu pai costumava me levar à sorveteria do shopping durante o inverno, só porque, segundo ele, um bom gelato deve ser degustado independentemente da estação.

Felizmente, décadas depois que ele me ensinou a cultivar esse gratificante hábito, me dou conta de viver onde tudo começou: com base em referências, os primeiros a produzir o verdadeiro gelato cremoso foram os florentinos no século XVI. Mais precisamente nos domínios da corte de Cosimo I de’ Medici. No entanto, graças a Caterina de’ Medici – à época também Rainha da França – o gelato se espalhou por toda a Europa. Que sábia connoisseur ela deve ter sido!

Aulas de história à parte, sinto-me na obrigação de esclarecer algo intrínseco a quem deseja captar o que significa um bom gelato. Antes de mais nada: gelato pode ser considerado a tradução italiana para a palavra sorvete, mas eles são entidades completamente diferentes. Mesmo o paladar menos apurado pode perceber nuances específicas logo depois de saborear uma colherzinha de ambos. Mas o que são essas distinções exatamente?

O que os diferencia, especialmente, é a proporção de dois ingredientes principais: no sorvete, a presença do creme é predominante enquanto um gelato é preparado com mais leite que, por sua vez, o deixa com menor teor de gordura (e você pensou certo: sim, é uma escolha mais saudável!).

Além disso, a forma como são batidos influencia na consistência, ou seja, requer velocidade muito mais lenta para o gelato, conferindo mais riqueza, densidade e delicadeza ao contrário do aspecto aerado de um sorvete. Além disso, o gelato geralmente não contém gemas de ovo, ao contrário do sorvete, e é servido um pouco menos frio, digamos, não completamente congelado, o que resulta em uma textura mais sedosa. Que cena linda de imaginar, não é mesmo?

Por último, mas não menos importante, você já notou como um gelato é mais saboroso? Isso porque a gordura e a temperatura afetam as papilas gustativas. Hmm... quem mais está com vontade de correr para a gelateria mais perto de casa? Pois bem, deixe-me ir direto ao assunto e poupá-lo, caro leitor, de mais detlhes fascinantes – ou entediantes - de química, e compartilhar os lugares de Florença onde mais gosto de refrescar minha alma!

Antes disso, gostaria de salientar um detalhe: segundo a minha cara-metade, uma das chaves da longevidade é nunca deixar de se deliciar com uma bola de gelato. Bem, a julgar pela boa forma dos italianos mais idosos que fazem fila basicamente todos os dias na nossa gelateria favorita – mesmo no auge do inverno –, este realmente deve ser o segredo para envelhecer bem. Na dúvida, siga o meu guia para uma vida longa, fresca e doce!

Além do fato de que seus donos são pessoas hiper adoráveis – o patriarca Sr. Silvano junto à sua filha, Cristina, e o marido, Aldo, que formam um experiente e querido casal de restaurateurs –, este é o meu refúgio faça chuva ou faça sol. O gelato artesanal deles é espetacular! Para amantes de pistache, como eu, é difícil provar algo diferente até porque o deles é tão bom que me lembra minha amada Sicília... No entanto, quando me sinto meio aventureira, a combinação perfeita de figo e ricota é uma explosão de sabores! Para os fãs de chocolate, no entanto, não perca mommy’s cookies (biscoitos da mamma), cremino ou bacio (beijo). Ah, em épocas festivas, como na Páscoa, há o sabor divino de Colomba Pascal ou de panetone no Natal... Ah, se o mundo conhecesse esta humilde gelateria de bairro, a famosa cidade medieval de San Gimignano poderia perder seu título como a capital mundial do gelato!

Em precisamente uma década esta prestigiada gelateria completará 100 anos! Ao longo dos tempos evoluiu para uma espécie de confeitaria sofisticada tornando-se uma referência quando se trata de doces, café e gelato. Desde a década de 1990 pertence a uma família diferente dos fundadores originais; no entanto, tradição e prestígio permanecem os mesmos. Embora seja um local fora do circuito turístico, no bairro residencial de Le Cure (perto da estação de trem Campo di Marte), atrai estrangeiros que buscam alta qualidade e fama. O best-seller Buontalenti – uma receita simples feita com creme, leite, açúcar e ovos – é uma homenagem ao findado arquiteto florentino Bernardo Buontalenti, responsável por apresentar à corte de Cosimo I de' Medici uma requintada iguaria congelada durante uma de suas muitas festas suntuosas: leia-se, o gelato. Bem, o resto é história!

P.S. Se você nunca esteve nesta gelateria, tudo o que posso dizer é: não perca mais tempo!

Minha terceira opção é uma gelateria sempre lotada localizada no coração do centro da cidade na mesma rua que deu origem ao seu nome. Mas o que eu mais gosto neste lugar não são apenas os produtos deliciosos, mas o passado de seu fundador: um ex-motorista de ônibus que no final dos anos 80 estava cansado de dirigir quilômetros de distância, sem parar, decidiu arriscar-se e aventurar-se em algo novo. Bravo! Com o passar dos anos, o precioso boca a boca dos turistas – especialmente de americanos – deu a este lugar uma notória dose de publicidade gratuita e, voilà, tornou-se um conhecido ponto de visita obrigatório em Florença (com razão!). A variedade de sabores – um pouco mais extensa do que a maioria dos lugares tradicionais da cidade – atende tanto aos paladares clássicos quanto aos mais exóticos.

Este lugar oferece o fascínio de estar em frente à ponte que lhe deu o nome - Ponte alla Carraia -, uma das mais antigas da cidade. Assim como muitas gelaterias de boa qualidade na Itália, esta também é uma operação familiar e praticamente todos os membros trabalham ou já trabalharam no local. Toda a linha de sabores é completa, então escolha o que mais lhe agrada: não tem erro! Mas se me permite colocar uma sugestão valiosa... pare para tomar um gelato no final de tarde enquanto observa o lindo pôr do sol beijar o horizonte do outro lado do rio Arno.